domingo, 7 de setembro de 2008

"AS FONTES DO HONESTO"

Marco Túlio Cícero nasce em 106 A.C. e veio a morrer em 43 A.C. (63 anos).

Cícero foi educado pelos mais brilhantes e eruditos professores da sua época, nos estudos jurídicos, de oratória, retórica e filosofia.

Orador e causídico famoso, seguiu a carreira das honras (cursos Honorum, Questor, Edil Curul, Pretor e Cônsul).

Defensor da República Romana das apetências dos partidários de formas de governo autoritárias.

Adversário de Júlio César é por este perdoado após uma derrota militar.

Para tentar salvar a “sua” república apoia a conjura para assassinar Júlio César.

Em oposição a Marco António, que considerava o símbolo da tirania, e para restaurar os ideais republicanos, pronuncia contra ele as Filípicas, que ditaram a sua morte, decidida por Marco António e Octaviano.

Já descrente da sorte da República, apesar da morte de César, considerava

Marco António um seu valido, continuador da tirania que aquele tinha estabelecido.

Em várias cartas que envia a seu filho Marco, estudante na Grécia, esquematiza e desenvolve o seu pensamento do que é essencial par uma vida digna.

O tratado De Oficiis, a obra moral de Cícero.

In Textos Filosóficos, edições 70.

Os princípios fundamentais do dever moral, de modo a poderem estabelecer um conjunto de regras de conduta.

a) O homem porque é dotado de razão pela qual compreende a relação de causa e consequência e pode estabelecer analogias, ligando e associando o presente e o futuro, compreende facilmente o curso de toda a vida, fazendo os preparativos necessários para a sua conduta.

b) A grandeza de alma, resulta de um espírito, pela natureza bem formado, não desejando submeter-se a ninguém, excepto àquele que estabelece as normas de conduta, ou é o mestre da verdade, ou que para o bem comum governa segundo a lei e a justiça.

È a partir destes dois elementos que se forja e se molda a honestidade.

A essência da honestidade encontra-se no conhecimento da verdade.

Tudo o que é honesto dimana de uma destas quatro fontes:

I

Sabedoria é o desenvolvimento inteligente da verdade, é sapiência, prudência e a manutenção dos laços sociais.

II

Manutenção dos Laços Sociais

III

Grandeza de Alma

IV

Decoro, ordem e moderação de tudo aquilo que se diz e faz, no qual a modéstia e a confiança subsistem.

As quatro fontes da honestidade encontram-se implicadas e interligadas, no entanto, cada uma dá origem a um certo tipo de dever.

Os homens pervertem os princípios fundamentais da natureza ao dissociarem a utilidade da honestidade.

Em relação ao dito ”do mal, o menos” é isto com efeito, agir sem honestidade.

Não devemos tomar o desconhecido por conhecido e aceitá-lo imediatamente.

O mérito de toda a virtude reside efectivamente na acção.

Virtude - são actos humanos, genericamente bons.

I

A sabedoria é a maior de todas as virtudes que consiste no conhecimento de todas as coisas humanas e divinas e incluem a convivência social.

A sabedoria é o desenvolvimento inteligente da verdade, é sapiência e prudência

Todo o nosso pensamento e actividade intelectual devem ser orientados em relação ás questões da honestidade, bem como ao estudo da ciência do conhecimento.

O que poderá, para além do saber, ser mais desejável ou mais notável? Que coisa melhor para o homem e dele mais digna poderá existir?

Toda a filosofia é fértil e frutuosa, e nela domínio algum pode ser mais rico e fecundo do que aquele que se dedica aos deveres, daí emanando preceitos para uma vida honesta e coerente.

Que não se tenha a ninguém de obedecer, que se goze a liberdade cuja essência é viver segundo a nossa própria vontade.

Devemos livrar-nos de toda a espécie de perturbações espirituais, não só da ambição e do medo como também do sofrimento, do prazer e da cólera, afim de que a tranquilidade e segurança de espírito possam ser usufruídas, as quais oferecem tanto à constância como à dignidade.

O sábio age de acordo com a razão e a natureza.

Todo o conhecimento alheio à justiça é astúcia, e nunca sabedoria

DEVER

A sabedoria é o conhecimento da verdade, o espírito de solidariedade, a magnanimidade e a moderação.

II

A manutenção dos laços sociais entre os homens e da vida em comunidade.

A primeira parte é a justiça, a rainha das virtudes, à qual se junta a generosidade, por elas existem os homens de bem.

O fundamento da justiça reside na boa fé, os que correm pela paixão do poder, pelas honras e pela glória, esquecem totalmente a justiça.

Não existe elo social mais importante que não seja aquele que une, cada um de nós à República. (Cícero)

Nenhuma comunidade é mais nobre, mais sólida, do que aquela na qual todos os homens de bem partilham os mesmos costumes.

Grande é também aquela comunidade que resulta da permuta de serviços, aqueles que os permutam ficam ligados entre si por sólidos laços sociais.

Que cada um possua o que lhe cabe, e se alguém tomar algo para si para além desse limite, violará as leis da sociedade humana.

Da injustiça existem dois tipos: um, a daqueles que fazem o mal; o outro, o daqueles que podendo evita-lo, nada fazem.

A injustiça deve ser sempre evitada.

A legitimidade vale por si própria, a dúvida pressupõe um juízo injusto.

Julgamos nós acerca dos outros e acerca de nós próprios de maneira desigual.

A amizade mais aprazível é aquela que a afinidade de carácter cimentou.

“Entre amigos todos os bens são comuns.” (Platão)

DEVERES

Deverá ser sobremaneira honrado aquele que mais dotado for destas virtudes: a modéstia, a temperança e a própria justiça.

A clemência é a contenção do espírito quando administra a justiça.

A beneficência é uma selecção baseada no mérito.

É grande o poder da benevolência, enquanto fraco o do medo.

A benevolência será avaliada pela sua constância e consistência.

III

A grandeza da alma é o que se realiza com grande elevação de espírito e com desprezo pelas vicissitudes humanas, e surgem aos nossos olhos como sendo a coisa mais magnífica.

A verdadeira e sábia grandeza da alma é aquela que considera serem as acções e não a glória, a constituírem a base daquela honestidade que a natureza toma, preferindo ser aquilo que é realmente a ter de parecê-lo.

Que os homens fortes e magnânimos sejam bons e simples, amigos da verdade e de modo nenhum falaciosos. Tais são as qualidades pelas quais é a justiça louvada.

Suportar aquilo que parece atroz, é próprio de um espírito robusto e de grande constância.

Em suma, aquela honestidade que buscamos num espírito grande e excelso é produto de um esforço anímico, e de modo nenhum poderá ser produto da força física.

É próprio de um espírito corajoso e firme manter a presença de espírito e a capacidade de deliberar sem perder o discernimento.

Porém, esta elevação de espírito em circunstâncias de perigo e de aflição, quando é desprovido de qualquer sentido de justiça ou quando se combate não pelo bem comum, mas, em defesa dos seus próprios interesses, nisso não há réstia alguma de virtude.

Os homens levados pela ilusão resvalam no mais ignominioso ridículo e cometem os erros mais hediondos.

DEVERES

Nada com efeito é mais digno de louvor, nada mais digno de um homem eminente e notável do que a clemência e o espírito de reconciliação.

Seguindo estes preceitos, poder-se-á viver com nobreza, honestidade e esperança, e também na simplicidade com lealdade e amando verdadeiramente os homens.


IV

A última divisão da honestidade, uma espécie de enfeite da vida, é a temperança e a ponderação (noção de decoro), que domina todos os conflitos da alma e é a medida de todas as coisas.

Foi-nos concedido pela natureza as partes relativas à constância, à moderação, à temperança e ao respeito, e nisto a mesma natureza nos ensina a não agirmos com negligência para com os nossos semelhantes, assim temos a possibilidade de nitidamente ver como é amplo o campo de interacção de toda a conveniência, que se estende, de uma maneira geral a toda a honestidade.

O conveniente consiste em tudo aquilo que é conforme à excelência dos homens.

O que é conveniente é honesto e aquilo que é honesto é conveniente.

Servir-se da razão e da linguagem com prudência é conveniente.

Todas as coisas justas são convenientes, as injustas são hediondas, consequentemente inconvenientes.

É conveniente aquilo que é conforme à natureza com vista à moderação e à temperança.

Enganar-se, errar e faltar à verdade é inconveniente.

O papel da justiça consiste em não violentar os homens, em relação ao respeito, em não ofendê-los (ser conveniente).

DEVERES

Quanto ao dever, o primeiro passo que nos conduz à harmonia com a natureza e ao respeito pelas suas leis, é ora seguindo o subtil e o inteligente, ora o mais conveniente para a comunidade dos homens, ora a fortaleza e a coragem.

OBTENÇÃO E MANUTENÇÃO DO PODER E DA GLÓRIA

No tratamento dos assuntos importantes da administração, é a glória assunto de grande relevância.

O ponto mais alto e a perfeição da glória residem nas três condições seguintes:

Se por ventura a multidão nos estima;

Se em nós deposita toda a sua fé;

Se pensa sermos nós dignos de alguma honra, à qual se pode acrescentar uma certa admiração.

As três condições, que foram apresentadas como constituindo os meios pelos quais podemos alcançar a glória, foram todas elas superadas pela justiça.

A justiça deve ser cultivada e mantida por todos os meios, não só para a sua própria salvação (caso assim não fosse, não haveria justiça) mas também pelo acrescentamento de honra e de glória.

Se alguém desejar a verdadeira glória da justiça alcançar, que cumpra ele próprio os deveres da justiça.

Entre todas as coisas, nada é mais apropriado para defender e manter o poder do que ser amado, e nada menos recomendável do que ser temido.

Um amor intenso emerge, todavia, da multidão, unicamente devido à própria reputação ou simples rumor da nossa generosidade, da nossa beneficência, do nosso espírito de justiça e da nossa lealdade, para além de todas as virtudes que se encontram associadas à afabilidade e à doçura de carácter.

Porém, quanto à lealdade, só poderá ser alcançada de duas maneiras: se agirmos com prudência e com espírito de justiça.

São exaltados com os maiores elogios aqueles homens em quem se vislumbram certas virtudes excelentes e excepcionais, enquanto que, de modo diverso, olham com desprezo e contundência aqueles em quem julgam não existir coragem, energia ou virtude alguma.

Aquele a quem o dinheiro não faz vacilar é digno da maior admiração em virtude de todos o verem como tendo conseguido superar a prova de fogo.

O caminho mais directo para a glória é o facto de se agir de maneira a “se ser tal e qual aquilo que se tinha desejado parecer” (Sócrates)

Recorrendo à simulação, à vã ostentação ou ainda ao disfarce, não só nas palavras se enganam como também em relação a tudo o mais.

A verdadeira glória possui raízes e ramificações e tudo aquilo que é fingido rapidamente cai por terra.

FIM