sábado, 29 de março de 2008

NÃO SE PASSA NADA, É SÓ FUMAÇA


É conveniente explicar aos mais novos e lembrar aos menos jovens, o que esta frase simboliza. Um velho almirante, por acidente também primeiro-ministro, gritava de uma varanda do Terreiro do Paço em plena manifestação, pós 25 de Abril, de milhares de pessoas, o facto de alguém ter lançado no meio da multidão uma granada de fumo criando o pânico.

Era um facto verdadeiro, no momento era só fumaça, uns dias depois quase ao mesmo tempo que a fumaça se dissipava, o almirante já não era primeiro-ministro.

Vem isto a propósito da “guerra” macaca entre dois “inenarráveis” directores de pasquins da nossa praça de Odivelas. O ex-director do Jornal de Odivelas vendeu os seus futuros serviços à Câmara via Presidente da mesma, quando esta quis e lhe apeteceu e pelo preço certo segundo deduzo.

Em plena luta eleitoral partidária comprou o jornalista e o jornal, matando de uma cajadada vários coelhos: entre os quais me incluo como candidato à comissão política local, cujo único meio de chegar às pessoas se centrava em especial nesse jornal, como era hábito e costumeiro.

O outro coelho é seguramente o “Berlusconi” de Caneças. O homem estava bebendo muito Red Bull, não ficar dependente de um simplório de aldeia é mais do que elementar, não vá o diabo tecê-las, concluiu seguramente a interessada.

Um outro coelho sem o saber é um dano colateral desta guerra, o problema é que o homem não se vende “nem por todo o ouro do mundo” e o patrão actual também não quer ficar descalço, como diria Maquiavel, agora vais fazer de raposa amanhã farás de cordeiro, quando eu mandar, dir-lhe-à quem lhe paga a mesada.

Como na verdadeira história, há sempre quem deseje o poder e haverá sempre quem queira servir o novo senhor, o bom do jornalista-director incorruptível já lança os olhares e os sinais de que “eu estou aqui” em várias direcções, crente seguramente que o seu mestre já conta pouco, ele sabe bem quem é o homem na sombra, nós também.

Esta história promete, com os partidos do sistema fingindo de “mortos”, se não o estão já na realidade, a líder dos cabedais da câmara põe e dispõe como entende, hoje compra este, amanhã poderá ser aquele outro, a espera mata e a senhora sabe.

Para quem ouviu em plena Câmara a justificação da contratação pela presidente do ex-director do pasquim, observando as reacções dos partidos, ficou claro de que “isto não é só fumaça”. Tenham todos um final feliz político, obviamente.

terça-feira, 18 de março de 2008

UM "governo com resultados"...maus


Por Alfredo Barroso

O MELHOR DESTE GOVERNO, até agora, é certamente aquilo de que Sócrates não pára de ufanar-se: uma redução rápida e brutal do défice do Orçamento do Estado, a par de um aumento pouco significativo da taxa de crescimento do PIB. Não sei se Sócrates também se regozija com o aumento vertiginoso das grandes fortunas, que se regista desde 2006. Mas a direita dos interesses e das negociatas, essa sim, está satisfeita. Não é por acaso que aplaude o Governo, embora nunca vote PS. Comparativamente com os anteriores Governos de direita, chefiados por Durão Barroso e Pedro Santana Lopes, o actual Governo de direita, chefiado por José Sócrates, é seguramente muito mais eficaz. Então em matéria de arrogância e autoritarismo, pede meças…
O pior destes três anos de Governo está bem à vista: aumento do desemprego e da precariedade; diminuição substancial do poder de compra dos trabalhadores e dos reformados; subida vertiginosa das desigualdades sociais e alargamento do fosso salarial entre ricos e pobres; diminuição pouco significativa da pobreza extrema e aumento brutal da pobreza relativa, com empobrecimento crescente da classe média. Tudo isto, somado a enorme intransigência e a um profundo desprezo pelos sectores sociais e profissionais mais afectados pela crise, leva-me a concluir que, perante este balanço do Governo de Sócrates, o PS bem pode limpar as mãos à parede...
Não sou católico nem crente mas… Deus nos livre de mais maiorias absolutas, que com as maiorias relativas podemos nós bem. O problema de Sócrates é o de conseguir convencer um país exangue de que os resultados positivos desta austeridade brutal e a redistribuição dos frutos deste crescimento pindérico estão para breve. Sabemos bem que isso é falso, mas a mentira é hoje uma componente essencial do jogo político. E é bem provável que uma população em desespero ainda aceite iludir-se por mais algum tempo. Até ao momento em que a indignação extravase e a revolta rebente...

domingo, 16 de março de 2008

SÓ VISTO, CONTADO NINGUÉM ACREDITA


A juntar ao ambiente político nacional (ver o país

suspenso pelas ideias do líder do PSD ao nível das

quotas) temos o burlesco de um (vários) convite à Presidente

da Junta de Odivelas, ex-PS para uma viagem à ”manife” no Porto.

Amor com amor se paga. Convite aceite, chamada pelo móvel a marcar

lugar na camioneta posta à disposição dos socialistas de Odivelas.

Aos entupidos e aturdidos ouvidos do primeiro interlocutor seguiu-se

uma lamentável recusa (transmitida pelo organizador de serviço)

por não haver lugares disponíveis.

UM partido aos papéis e uma mulher de pêlo na venta.

Devia ser bonito de se ver o “ar da malta” no Lisboa-Porto-Lisboa.

Foi pena, quem não “os” teve no sítio, foi quem convidou.

sexta-feira, 14 de março de 2008

CASA ROUBADA TRANCAS NA PORTA

A PEDIDO DE "VÁRIAS FAMÍLIAS" PUBLICO O MEU CONVITE À PARTICIPAÇÃO.


Caro e Cara Camarada,

Seleccionei o seu nome de entre uma lista com cerca de 2000 inscritos na Concelhia de Odivelas do Partido, pelo seu perfil de idade, profissão e residência, convicto de que é sincera a sua vontade de continuar militante socialista, intervindo e participando nas decisões colectivas.

Convido-o a preencher a sua declaração de candidatura à CPCO que junto lhe envio, e desde já assumo o compromisso que será integralmente cumprido de que: os lugares na lista serão sorteados entre todos os presentes que se dignarem candidatar-se, em reunião especialmente convocada para essa formalidade.

O método de eleição da CP é um sistema proporcional: se tivermos (X) votos, elegeremos o nº correspondente de lugares. Se os nossos camaradas nos delegarem essa responsabilidade, voltaremos a ter uma CP onde as decisões serão colectivas e não a emanação da vontade de uma, ou duas cabeças que se considerem iluminadas.

Quem conhece a dura realidade de uma vida de trabalho, sabe que é humanamente impossível estar em todo o lado ao mesmo tempo. São tiques doutros tempos querer tudo e todos dominar, como diriam os nossos avós, “quem muitos burros toca algum fica para trás”, somos um PARTIDO SOCIALISTA, e não uma seita de partilha das benesses do exercício do poder.

Ser um bom Presidente de Câmara não é tarefa fácil, ser simultaneamente Presidente da CP, só poderá ser entendido como uma ambição desmedida e não consentir um controlo democrático.

As eleições são no próximo dia 7 Março (sexta-feira) nas secções de residência, as candidaturas terão que ser entregues até ao dia 26 Fevereiro (terça-feira), na FAUL. A nossa reunião de ordenação da lista será uns dias antes (convocatória será enviada).

Está nas suas mãos o futuro próximos da escolha dos nossos autarcas, quer nas Juntas, quer na Câmara, nas empresas municipais e mesmo nas diversas eleições internas. Se nada fizer, é o mesmo que dizer que os cargos de eleição são vitalícios.

Coloque a sua Declaração de Candidatura no envelope junto, e envie o mais rápido possível, afim de não termos problemas desnecessários com os inevitáveis atrasos que sempre ocorrem.

Por uma vida com LIBERDADE E RIGOR.

Ramalho dos Santos

Militante Nº 5097

ELEIÇÕES INTERNAS A PREÇO DE OURO

Exmos. Senhores

Comissão Técnica de Eleições da FAUL

Secretário Federativo

para a Organização da FAUL

Presidente da Comissão

Caro Camarada João Serrano

Odivelas, 11 de Março de 2008

Assunto: Eleição da Comissão Política Concelhia de Odivelas

Pagamento de quotas a militantes

Armando Fernando Ramalho dos Santos, militante n.º 5097 de 1 de Junho de 1975, vem apresentar a esta Comissão dúvidas quanto à correcta observância dos Estatutos do Partido, do Regulamento para a Eleição das Comissões Políticas Concelhias da Federação Área Urbana de Lisboa e do Regulamento de Quotas do Partido Socialista.

Cabe à Comissão clarificar o modo de pagamento de quotas e se algo de menos legítimo ocorreu no processo eleitoral para a Comissão Política Concelhia, no que diz respeito, concretamente, aos militantes da Concelhia de Odivelas.

O bom-nome dos militantes do Concelho está em causa e, caso se não tenha observado o rigoroso cumprimento do que está regulado, é meu dever de militante impugnar as referidas eleições.

Consta na esfera política local, que um elevado montante foi entregue ao Partido para liquidar um elevado número de quotas de militantes com atrasos superiores ao legalmente permitido. Comenta-se que foram pagas quotas de mais de dois (2) anos de atraso.

Um profundo mal-estar está instalado na comunidade, com custos de imagem para o Partido, sendo os seus militantes honestos desacreditados injustamente.

Publiquei nos jornais locais e em devido tempo que, sendo candidato às respectivas eleições, não pagaria quotas de ninguém e que considerava indignas tais práticas.

Assim Camaradas, aguardo a cabal prova que tais procedimentos não são verdadeiros e, consequentemente, que os resultados da respectiva eleição são legítimos.

Politicamente, além deste facto, há matéria mais do que relevante para que qualquer militante sério se indigne, é o meu caso.

Com os meus cumprimentos.

Ramalho dos Santos

sábado, 8 de março de 2008

ALGUÉM DEVE MUDAR DE VIDA

Não será admissível que não se tirem conclusões políticas deste desaire do poder em funções e se apontem os responsáveis por este descalabro e descrédito público das nossas instituições políticas. Uma lista apoiada pùblicamente e veementemente veiculada como sendo a única que representa o espírito do “rumo certo” político da presidente da câmara e da comissão política concelhia. Uma lista em que se alinham os pesos pesados em funções, a saber: o Vice-presidente da câmara, a vereadora da cultura da mesma câmara, o gestor único das empresas municipais, o ex-poderoso homem forte do desenvolvimento urbanístico de Odivelas, dirigentes associativos de relevo etc.. Todos vencidos por ex-jotas, que segundo algumas iluminárias eram controláveis, pois eram “dependentes económicos” dos lugares “oferecidos” por quem tudo pode, melhor dito podia. Vamos aguardar. Retaliações seriam de um profundo mau gosto, vindo de quem não pode em caso algum afirmar uma legitimidade política partidária incontestável.

O PODER DO DINHEIRO NAS ELEIÇÕES

No passado sábado, no expresso, José Seguro aborda este tema. Nestas eleições internas o poder vigente em Odivelas acordou tarde para a questão. Com a incompetência em cultura partidária habitual, sempre entretidos em pequenas e pouco dignas tramas politiqueiras, foi o pânico geral, não só tinham uma candidatura adversa como seria uma desonra ter um fraco nível de votação. Consta que a solução foi colocar dinheiro na resolução do problema, vários rumores afirmam que há pessoas disposta a dar testemunho de aliciamento nesse sentido. Com uma abstenção a rondar os 70% e acreditando não existir água benta na história, é permitida a seguinte reflexão. Votaram perto de 670 inscritos nos cadernos. Se o maior número destes não pagava quotas desde o segundo semestre de 2006 - data das últimas eleições internas – temos em valores redondos 600 x (2 euros x 18 meses) = 21.600 euros. Bonita maquia.

Consta à boca pequena entre os militantes normalmente credíveis que um valor aproximado foi apresentado nos serviços do partido. É a este último que se deve pedir esclarecimentos. Os estatutos são claros nesta matéria, o pagamento deve ser estritamente pessoal e individualizado. Se assim não foi, há motivo suficiente para a anulação das eleições. Estaremos perante uma violação grave dos estatutos. A credibilidade política do partido está em causa.

O TABU DA LISTA PARA A CPCO

A lista ordenada por importância política de 1 a 55 e outra igual de suplentes com os respectivos nomes foi retida e mantida secreta dos militantes de Odivelas por que razão? É uma evidente manobra de chicos espertos e uma tremenda falta de respeito democrático: entregue na Federação no passado dia 26 de Fev. levou cerca de 10 dias a ser conhecida e só esteve exposta na hora das eleições. Objectivos a atingir são vários: o mais significativo é o do possível desconforto de alguns pela posição relativa em que foram colocados. Normalmente em listas únicas o método é uma ordenação alfabética, só a vaidade de alguns não deve ter permitido que assim fosse. A dissimulação visava evitar algum descontentamento militante que se transformasse e alastrasse em abandonos prematuros e massivos.

O CORDEIRO DA PÁSCOA

O Vice-presidente da câmara Sérgio Paiva, foi ao sacrifício de umas eleições internas que sempre considerei perdidas de avanço, por imperativo da presidente que não tinha alternativa credível.

Uma vez mais tentou embrulhar na segunda posição a “iminência parda” Mário Máximo à boleia de um número de velhas glórias com credibilidade e passado na concelhia.

A lição a tirar deste acto falhado é de que foram avisados “de que quem tem castanhas no lume é que deve cuidar delas”.

O FUTURO É DA JUVENTUDE SOCIALISTA

Estão de parabéns os que ousaram uma estratégia de frontalidade e colocaram um basta no quero, posso e mando da toda-poderosa presidente.

Uma ambição política controlada inibiu a J.S. de concorrer à comissão política concelhia. Uma vitória para o secretariado da secção é um justo prémio, tem por base dois alicerces fundamentais: revolta sobre a tutela e vontade da presidente da CPCO, e a forte coesão existente na J.S., transferida com êxito para o P.S..

Saber gerir o potencial político existente em Odivelas determinará o futuro eleitoral do P.S. no concelho.

quinta-feira, 6 de março de 2008

1º COMENTÁRIO DESTE BLOGUE


"UMA OPORTUNIDADE PERDIDA"


Meu caro para além das razões que encontrou para justificar a ausência de participação dos militantes no seu projecto, existem ainda outros que devem ser denunciados, designadamente o distanciamento dos cidadãos da vida partidária; a podridão que grassa nas máquinas partidárias onde hoje já se faz tudo descaradamente e já se oferece o pagamento das quotas de todos bem como das suas famílias para cacicar os apoios do agregado familiar; a oferta de lugares na Câmara para levar as pessoas a aceitar integrar o projecto do poder; a compra de jornais e jornalistas para dar cobertura ao poder; e tudo isto está a acontecer em Odivelas, e por isso a sua generosidade na luta pelos seus ideais dificilmente no quadro actual poderia obter êxito, mas não é por isso que deve desistir, pelo contrário a sua luta deve-se acentuar quanto mais não seja pela denúncia desta podridão.
Um abraço

Leitor identificado

terça-feira, 4 de março de 2008

UMA OPORTUNIDADE PERDIDA

Caro e Cara Camarada,

Com uma já longa experiência em campanhas internas no Partido Socialista e, tendo uma visão do mundo e das pessoas optimista, devo confessar-lhe que ainda não tenho todos os elementos que permitam extrair conclusões sobre o desinteresse quase total à minha proposta de participação, essencialmente democrática e aberta a todos.

Vários considerandos estão em análise, e de entre todos os possíveis e lógicos coloco, em primeiro lugar, o valor das quotas, agravado pelo sistema de cobrança instituído e por haver quase sempre mais do que um elemento inscrito da mesma família, elevando assim o valor a pagar à “boca das urnas” para verbas significativas.

Sei que é do interesse dos “instalados” não cuidarem de manter limpo de inscritos “fantasmas” o ficheiro dos militantes, para poderem reclamar protagonismos que na realidade não têm, e poderem também manipular a seu belo prazer uma representatividade que não lhes assiste.

Considerei que: dos cerca de 2000 inscritos no ficheiro, estariam activos 500. Foi a esse número de militantes a quem propus uma participação democrática, convicto de que os envolvidos nas teias dos interesses, e que gravitam em torno do poder por não terem peso próprio, não estariam minimamente virados para as propostas democráticas que recorrentemente vinha fazendo.

A seu tempo saberemos o que realmente se passa. O mais importante neste momento é felicitá-lo por ter aderido com o seu apoio desinteressado, e informá-lo que não ultrapassámos as duas dezenas, a que se juntaram outras duas dezenas de camaradas amigos de longa data.

Se a realidade fosse evidente, considerando todos os factores observados, poderíamos afirmar que somos uma enorme força política na concelhia, mas….

Na próxima sexta feira dia 7, depois de votar, está convidado para jantarmos ou petiscarmos (ou para um simples café) todos juntos, pelas 20.00 horas no Restaurante CABAÇA DE OURO, e aí DISCUTIREMOS LIVREMENTE os resultados EM DEMOCRACIA e com RIGOR.

Espero que possa estar presente (não é preciso marcar). Novas eleições se avizinham e a nossa participação será importante para um futuro mais digno.

O ex-candidato à Comissão Política Concelhia

Ramalho dos Santos

domingo, 2 de março de 2008

Josefa a Avó de José Saramago

CARTA PARA JOSEFA, MINHA AVÓ

Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo - e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira - sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.

Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos de rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. Para ti, a palavra Vietnan é apenas um som bárbaro que não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio. Da fome sabes alguma coisa; já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja. (contaste-mo tu ou terei sonhado que mo contavas?) Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém.


Estou diante de ti e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha-vã e chão de barro. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos - e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Por que foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto talvez entenda eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesse escolher das minhas inumeráveis palavras as que tu pudesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti - e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava.

Não teremos, realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são como as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas - e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, por que te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila necessidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: "O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer"


É isto que eu não entendo - mas a culpa não é tua.